António Mendes Antunes
Aluno
da Licenciatura em Educação na Universidade Aberta de Portugal, Unidade
Curricular Psicologia do Desenvolvimento
Resumo:
Muito se tem dito sobre a vinculação no
processo de desenvolvimento humano. Ela é entendida como a necessidade do
indivíduo em estabelecer relações afectivas com outros seres humanos. Varia
em cada etapa de desenvolvimento e perdura ao longo de toda a vida. No
entanto, ao falarmos da vinculação no processo de desenvolvimento humano,
necessariamente devemos nos referir também à separação/individuação que responde
à necessidade do indivíduo criar a sua própria individualidade. E, é da tensão
desta com aquela, que favorece o desenvolvimento psicológico do indivíduo. Assim, pretende-se com este trabalho, no âmbito da cadeira de Psicologia de Desenvolvimento da
Licenciatura da Educação da Universidade Aberta, focar o conceito da
vinculação e analisar a sua relação com a resiliência psicológica, entendida
como a capacidade do indivíduo em enfrentar situações adversas que surgem no
dia a dia.
Palavras
chaves: vinculação, resiliência, individuação
Introdução
Segundo
estudos o processo de desenvolvimento psicológico decorre da tensão entre o
processo de vinculação e o processo de separação/individuação. E, estes dois
processos vão conhecendo nuances diferentes, dependendo da etapa de
desenvolvimento do indivíduo ao longo da
vida. Porém, o processo de vinculação não é linear. Ele varia tendo em conta
diversos factores, como por exemplo a cultura, a idade, etc. A necessidade de
protecção e de afecto não são iguais entre um bebé de três meses e um outro de
catorze. Do mesmo modo que é diferente entre uma criança pequena e um
adolescente e, entre este e um adulto. Neste contexto, vamos nos centrar no
processo de vinculação na infância e fazer a sua correlação com a resiliência
na fase adulta.
Vinculação
A
vinculação é uma necessidade primária de todo o ser humano, assim como a
alimentação e outras necessidades fisiológicas. Sem ela o desenvolvimento
físico e psíquico da criança fica comprometido e pode mesmo levar à morte.O
comportamento de vinculação resulta da necessidade do bebé de criar e manter
relações de proximidade e afectividade com outros seres humanos no sentido de
obter protecção e segurança. Esta relação é decisiva para o desenvolvimento da
criança. O
processo de vinculação inicia desde o período de gestação quando o casal começa
a criar vínculos com o bebé, imaginando-o, desejando-o e criando espectativas e
prossegue ao longo do ciclo vital.
Segundo
Bowlby (1978), o bebé, ao nascer já está equipado com um número de sistemas
comportamentais que fornecem as bases para o desenvolvimento posterior do
comportamento da vinculação, prontos a serem usados logo ao nascer. São essas
capacidades inatas (sucção, preensão, orientação, choro e sorriso) que permitem
ao bebé estabelecer o laço de afectividade, primeiramente, com as chamadas
figuras de vinculação, que são pessoas que estão mais próxima do bebé,
normalmente os pais e principalmente a mãe biológica, que lhe garante
protecção, segurança e conforto. Aos poucos vai-se alargando a outros membros
da família e a outras pessoas.
Do mesmo modo, a criança vai desenvolvendo
capacidades perceptivas precoces de reconhecimento e de diferenciação e que lhe
permite iniciar a sua individuação, fundamental para a construção da sua
própria personalidade. O sentimento de segurança e de confiança que vai
adquirindo dessa relação com a figura de vinculação, estimula a criança a
explorar o meio que a cerca, a afastar-se das figuras de vinculação e a iniciar
o processo de separação/individuação.
M.
Fleming (2005) explica a interacção
existente entre o processo de vinculação e o processo de separação/individuação
através das premissas do modelo a que chamou de dupla hélice de
desenvolvimento: a) o desenvolvimento psíquico do ser humano resulta da tensão
entre o processo de vinculação e de separação; b) estes processos estão activos
durante todo o ciclo de vida e ocorrem em simultâneo; c) a vinculação
corresponde ao processo de ligação afectiva a outros como meio de assegurar a
sobrevivência; d) individuação corresponde ao processo de construção da
indentidade; e) a articulação entre estes dois processos é diferente consoante
o momento de vida e consequente etapa de desenvolvimento.
Pesquisas
de Lorenz, demonstram que o vínculo que se estabelece entre o bebé e a figura
de vinculação, a que ele chamou de “imprinting”, não deriva da satisfação das
necessidades fisiológicas mas sim da necessidade inata de um vínculo social. A conclusão semelhante chegou Harry Harlow através da experiência com macacos,
demonstrando uma vez mais que esse vínculo deriva não da necessidade de
alimentos mas sim de afecto e de protecção.
Mary
Ainsworth, distinguiu três categorias de vinculação de acordo com as suas
observações: a vinculação segura, a vinculação evitante e a vinculação
ambivalente/resistente.
Ao
fazer esta distinção ela demonstra a importância das primeiras vinculações e
que a sua qualidade influencia as relações que a criança vai estabelecer no
futuro, designadamente com colegas e professores.
Assim, a ausência dessa figura de vinculação ou quando esse vínculo é deficitário,
provoca sérias consequências nas crianças, que são duradoiras e muitas vezes
irreversíveis.
Spitz
ao estudar as consequências da privação do laço afectivo, concluiu que bebés
apresentavam perturbações somáticas e psicológicas. Essas crianças apresentavam
atraso no desenvolvimento corporal, dificuldades nas competências manuais e na
adaptação ao meio ambiente e atraso na linguagem. Apresentavam menor
resistência às doenças e em casos mais graves, a apatia.
Para
Harlow, a privação desse contacto humano traduzir-se-ia em perturbações físicas
e psicológicas profundas.
Resiliência
A
resiliência é entendida como a capacidade do indivíduo em enfrentar e lidar com
situações difíceis. Boris Cyrulnick define-a como uma «arte de navegar nas
torrentes». E sendo uma arte, é um processo, um caminho de desenvolvimento a
percorrer.
É
um conjunto de competências do indivíduo, de um grupo social ou de uma
comunidade que permite gerir as circunstâncias da vida com sucesso e de forma
adaptada. E estas competências podem modificar-se ao longo do tempo, conforme a
variabilidade dos recursos internos e externos (do indivíduo, do grupo ou da
comunidade), e a variabilidade dos riscos inerentes à vida, passíveis de
provocar desequilíbrios e desajustes.
Portanto
a resiliência pode ser aprendida desde a pré-infância e, segundo especialistas,
está fortemente relacionada à auto-estima do indivíduo.
A
base da teoria de vinculação postula que a ligação da mãe ao bebé, fundamenta o
modelo das relações futuras do sujeito e influencia a sua competência social e
desenvolvimento emocional ao longo da vida.
Ainsworth,
ao distinguir a vinculação segura, a evitante e a resistente, demonstra que a
qualidade desse processo virá a influenciar mais tarde o equilíbrio e a
adaptação social.
Outrossim, as conclusões dos estudos de diversos autores como o Splitz, Harlow, Bowlby, de entre outros, demonstram que
quando o indivíduo é privado desse laço afectivo a uma figura de vinculação,
o seu processo de desenvolvimento cognitivo, físico, biológico etc, ficam
comprometidos, desenvolve apatia, baixa auto-estima, dificuldades de
relacionamento, de entre outras consequências, que à partida, condicionam o
indivíduo no desenvolvimento ou aprendizagem da resiliência. Ou seja, esses
factores tornam o indivíduo menos resiliente ou estará menos apto a lidar com
os desajustes e desequilíbrios inerentes à vida.
Em
jeito de conclusão diríamos que o processo de vinculação é uma necessidade
inerente a todo o ser humano e que é através da interacção/tensão entre este e
o processo de separação/individuação é que resulta o desenvolvimento psíquico
do indivíduo.
A
vinculação, acontece ao longo da vida e é fundamental que, desde a infância,
ocorra da melhor forma possível, pois fornece as bases de relacionamento
emocional e de competências socias para o futuro. Poder-se-ia dizer que quanto
melhor for o processo de vinculação, melhor preparado estará o indivíduo em
demonstrar a sua resiliência perante situações menos favoráveis da vida.
Bibliografia